sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

A lenda do Beijo Eterno de Sortelha

Para entrar na fortaleza medieval de Sortelha há que atravessar a Porta Principal.
À entrada, do lado esquerdo, está o Beijo Eterno, um conjunto de dois barrocos, que quase se tocam corporizando a lenda do beijo eterno que deu origem ao Casteleiro.

Conta-se que no início da Reconquista, quando cristãos e mouros avançavam e recuavam ao sabor da sorte das armas, Sortelha sofreu um rigoroso cerco pelas tropas sarracenas, que a todo o custo queriam recuperar aquele ponto estratégico.

No castelo vivia o alcaide, homem forte e valoroso, a sua mulher, que todos diziam possuir poderes mágicos, e uma filha, donzela casta e formosa.

O cerco terá durado tanto tempo que a pobre rapariga farta de não poder sair do castelo, se entretinha a espreitar do alto das muralhas o movimento no acampamento das tropas inimigas.
Cedo, começou a reparar no garboso príncipe árabe que comandava aquele exército.
Ao princípio ria-se da sua roupa esquisita e dos seus costumes tão diferentes dos seus. Mas, com o tempo, começou a sentir que o coração batia mais depressa quando o via passar montado no seu belo cavalo. O tempo foi passando até que um dia, durante um reconhecimento à volta da muralha, o príncipe a viu com os seus cabelos soltos a brilhar ao sol.
Ficou sem fôlego.
Nunca tinha visto uma beleza assim.

Por sinais e gestos foram-se comunicando, às escondidas de todos. Com a conivência de alguns soldados do castelo e a coberto da noite o príncipe começou a deixar-lhe pequenos presentes na muralha onde se costumavam ver e que ela ao outro dia retribuía.
Aos poucos o amor foi crescendo e cada vez era maior a vontade de ambos, de se encontrarem.
A mãe da menina, entretanto andava muito desconfiada de que qualquer coisa estranha se passava. Primeiro, a filha antes tão triste e tão calada, tinha agora o rosto iluminado por uma luz nova e por diversas vezes a surpreendera a cantar sem prestar atenção ao pano que bordava no bastidor. Ainda pensou que era apenas a chegada da Primavera e o desabrochar da juventude. Mas quando viu nos seus olhos o horror estampado, ao falar-lhe do gosto que ela e o pai tinham no seu casamento com o filho do alcaide do Sabugal, percebeu que o caso era bem mais sério.
Começou a vigiá-la. Mas a menina era tão cuidadosa que nos dias seguintes a mãe não conseguiu tirar a história a limpo.
Entretanto, o príncipe tinha subornado os três soldados que estavam a par do romance para deixarem sair a menina, quando ficassem os três de sentinela às portas do castelo.
O tão esperado dia chegou.
E quando depois da ceia a menina se quis recolher mais cedo a pretexto de uma dor de cabeça, a mãe teve a certeza de que qualquer coisa ia acontecer nessa noite.
Sem querer alertar o marido, deitou-se ao lado dele como sempre mas não adormeceu.
De madrugada teve a sensação de que ouvira um ruído. De mansinho levantou-se, vestiu-se e foi ao quarto da filha. Estava vazio. Desesperada correu para o alto da torre. Lá de cima tudo parecia calmo. No entanto depois de habituar os olhos à escuridão viu que qualquer coisa mexia mesmo por baixo do sítio onde estava. De repente as nuvens descobriram a lua e a mãe estupefacta viu a menina nos braços do príncipe árabe, beijando-o. Num terrível acesso de raiva, a mãe desencadeou um tal poder que de imediato os dois amantes desapareceram. Quando o sol se levantou, descobriu-se com espanto que no local onde eles se tinham encontrado, estavam agora dois barrocos como que se beijando eternamente.

Os mouros quando se aperceberam de que o seu chefe desaparecera misteriosamente durante a noite, levantaram o cerco e foram-se embora.

Quanto ao pobre alcaide, além de ter descoberto que estava casado com uma feiticeira, coisa que na época não era muito bem vista, ficara sem a filha que tanto amava, resolveu então pedir ao rei que o substituísse no cargo, e refugiou-se com a mulher numas terras que tinha no vale, dando origem ao lugar do Casteleiro.

- Margarida Magalhães Ramalho, Aldeias Históricas

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